Listeriose

Listeriose
 

 

1. Generalidades

  • A listeriose é uma infeção causada pela bactéria Listeria monocytogenes (L. monocytogenes), habitualmente associada ao consumo de alimentos contaminados.
  • Apesar de pouco frequente, a infeção pode ser grave, especialmente em imunodeprimidos e recém-nascidos.

 

2. Agente infecioso

  • A Listeria é uma bactéria Gram positiva, que inclui várias espécies, algumas das quais podem causar doença no ser humano e nos animais.
  • A L. monocytogenes é a espécie mais frequentemente associada a doença no ser humano. É ubíqua no ambiente, existindo principalmente no solo e na água. Os reservatórios animais incluem mamíferos domésticos e selvagens, galináceos e ainda seres humanos, sendo frequente a situação de portadores assintomáticos por períodos prolongados.
  • A L. monocytogenes tem crescimento ótimo entre 30 e 35ºC, mas suporta temperaturas de refrigeração (4-10ºC), contrariamente a outros agentes patogénicos de zoonoses e doenças transmitidas por água e alimentos.

 

3. Vias de transmissão

  • A transmissão da bactéria pode ocorrer nas seguintes situações:
    • Contacto direto com animais (reservatórios);
    • Consumo de alimentos e produtos alimentares contaminados, de origem animal e vegetal, processados ou não;
    • De mãe para feto (vertical) ou durante a passagem pelo canal de parto infetado.
  • Os alimentos e produtos alimentares contaminados, mais frequentemente associados à aquisição de infeção, incluem:
    • Carne crua de vaca, porco ou aves;
    • Crustáceos, mariscos ou moluscos;
    • Leite e derivados não pasteurizados;
    • Frutas e vegetais crus ou mal lavados.
  • Pode ainda ocorrer contaminação cruzada em alimentos processados, nomeadamente charcutaria e congelados.

 

4. Quadro clínico

  • A maioria dos adultos saudáveis não desenvolve doença após infeção.
  • A listeriose, à semelhança de outras doenças transmitidas por alimentos, habitualmente manifesta-se por uma gastroenterite com febre, náuseas e diarreia.
  • A doença tem um período de incubação médio de 3 semanas, podendo variar entre 3 e 70 dias.
  • Na grávida, a maioria das infeções é assintomática ou mimetiza uma síndroma gripal. No entanto, pode ocorrer aborto, parto pré-termo, nado-morto ou doença grave no recém-nascido.
  • No recém-nascido estão descritas duas formas de doença:
    • O de início precoce, que se manifesta por prematuridade, sépsis ou pneumonia. Nos casos mais graves pode surgir exantema papular, caracterizado histologicamente por granulomas (granulomatose infantiséptica);
    • O de início tardio, após a primeira semana de vida, manifestando-se habitualmente por meningite.
  • Em doentes imunodeprimidos e em idosos ocorrem, por vezes, infeções graves como sépsis, meningite ou encefalite, podendo atingir uma taxa de letalidade de 30%.

 

5. Diagnóstico laboratorial

  • O diagnóstico laboratorial pode ser realizado para deteção da bactéria, em amostras de sangue, placenta, líquido cefalorraquidiano ou outras, colhidas de acordo com o quadro clínico.
  • A caracterização genética da bactéria (definição do serótipo) pode ser útil para a identificação da fonte de eventuais surtos.

 

6. Tratamento

  • Utiliza-se antibioterapia (penicilina ou ampicilina, entre muitas outras opções) e tratamento sintomático de acordo com a apresentação da doença.
  • Na grávida, o tratamento atempado pode prevenir a infeção no feto ou no recém-nascido.

 

7. Notificação da doença

  • Em Portugal, a listeriose é uma doença de notificação obrigatória desde 2014, através do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE).
  • Requer a aplicação de inquérito epidemiológico com o objetivo de identificar a fonte da infeção e desencadear rapidamente medidas adequadas.

 

8. Medidas de prevenção e controlo

  • A listeriose pode ser prevenida através de medidas individuais de higiene e segurança alimentar, bem como no contexto da indústria agroalimentar e de estabelecimentos de restauração e bebidas.
  • Recomenda-se:
    • A nível da atividade industrial e de estabelecimentos de restauração e bebidas, o cumprimento dos princípios do sistema HACCP (Hazard Analysis and Critical Control Point);
    • A nível individual, o processamento e manuseamento de produtos alimentares com os seguintes cuidados:
      • Evitar a ingestão de alimentos crus de origem animal;
      • Lavar bem a fruta e vegetais crus;
      • Cozinhar bem os alimentos;
      • Consumir os alimentos o mais brevemente possível após a sua confeção;
      • Evitar o contacto entre alimentos crus e cozinhados;
      • Manter a temperatura de refrigeração a ≤4ºC;
      • Proteger os alimentos do contacto com animais;
      • Reforçar a boa higiene das mãos após a manipulação de alimentos crus;
      • Manter as superfícies, equipamentos e utensílios que contactem com os alimentos devidamente higienizados.

 

Quadro 1. Principais surtos de listeriose desde 1980 (atualização a 26/01/2018)

País

Ano

Nº casos/Nº óbitos

Fonte

Referência

África do Sul*

2017-2018

948/180*

Carnes frias

http://www.nicd.ac.za/index.php/source-of-listeria-outbreak-identified/

http://www.nicd.ac.za/index.php/nicd-situation-update-on-listeriosis-outbreak-3-march-2018/

EUA

2015

30/3

Queijo amanteigado ou de barrar

https://www.cdc.gov/listeria/outbreaks/soft-cheeses-09-15/index.html

EUA

2014

35/7

Maçãs caramelizadas pré-preparadas

https://www.cdc.gov/listeria/outbreaks/caramel-apples-12-14/index.html

EUA

2012

22/4

Salada de queijo Ricota

https://www.cdc.gov/listeria/outbreaks/cheese-09-12/index.html

EUA

2011

147/33

Meloa

https://www.cdc.gov/listeria/outbreaks/cantaloupes-jensen-farms/index.html

Portugal

2009-2012

30/11

Queijo

https://www.eurosurveillance.org/docserver/fulltext/eurosurveillance/20/17/art21104-en.pdf?expires=1516899178&id=id&accname=guest&checksum=8404456F3D9FC4D3005B04310EBDA50A

Austrália

2009

36/4

Wraps de frango

http://online.liebertpub.com/doi/pdf/10.1089/fpd.2013.1697;

www.innocua.net/web/download-502/fpd2e20132e1697.pdf

Canadá

2008

57/24

Carnes frias fumadas

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26258258

EUA

1998-99

108/18

Salsichas tipo Frankfurt

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2870438/pdf/S0950268805005376a.pdf

Itália

1997

1566**/0

Salada de milho e atum

http://www.nejm.org/doi/pdf/10.1056/NEJM200004273421702

França

1992

279/92

Língua de porco gelificada

Norton DM, Braden CR. Foodborne Listeriosis, Ch 10. In: Ryser ET, Marth EH, editors. Listeria, listeriosis and food safety. 3rd ed. Boca Raton: CRC Press Taylor & Francis Group. 2007;305-56.

EUA

1985

142/48

Queijo amanteigado

http://www.outbreakdatabase.com/details/jalisco-products-inc.-queso-fresco-and-cotija-cheeses-1985/

Suíça

1983-87

122/31

Queijo amanteigado

Bille J. Epidemiology of human listeriosis in Europe, with special reference to the Swiss outbreak. In: Miller AJ, Smith JL, Somkuti GA, editors. Foodborne Listeriosis. New York: Elsevier Science Publishers. 1990:71-4.

Canadá

1980-81

41/18

Legumes picados

http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJM198301273080407

* Surto em curso - dados disponíveis a 03/03/2018
** Listeriose não invasiva

 

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